As barras de proteína no escritório, os géis na mochila do ginásio, os batidos na pausa para almoço: os snacks desportivos parecem estar em todo o lado.
Muitos corredores ocasionais e frequentadores de ginásio sentem quase culpa se treinam sem uma barra ou uma bebida na mão. As marcas repetem que “combustível” significa desempenho, mesmo para um treino curto. No entanto, para a maioria das pessoas que se mexem durante menos de 90 minutos, o corpo funciona de forma muito diferente dos slogans de marketing.
O novo ritual do snack desportivo
Passe por qualquer supermercado no Reino Unido ou nos EUA e o padrão é o mesmo: prateleiras cheias de barras “energéticas”, bolachas de “performance”, muffins proteicos, gomas vitamínicas e bebidas de cores néon. O que antes era um nicho para maratonistas transformou-se num corredor de “estilo de vida”.
Quem faz exercício de forma casual compra agora estes produtos para uma aula de cycling de 45 minutos ou uma sessão rápida de pesos depois do trabalho. Muitos levam uma barra na mala “para o caso”, como se não comer antes ou depois de cada treino pudesse sabotar os resultados.
A crença generalizada: cada treino precisa de um snack especial, ou o corpo vai “ficar sem combustível”.
Investigadores em nutrição desportiva dizem que essa crença raramente coincide com a forma como o corpo realmente gere a energia. Para a maioria dos adultos saudáveis a fazer atividade moderada durante menos de uma hora e meia, as reservas existentes fazem muito bem o trabalho.
O que a fisiologia realmente diz sobre treinos curtos
Durante uma corrida típica de 45 a 60 minutos, um circuito no ginásio ou uma aula de ciclismo indoor, os músculos usam sobretudo duas fontes:
- glucose já a circular no sangue
- glicogénio armazenado nos músculos e no fígado
Essas reservas vêm de refeições feitas nas horas e dias anteriores, não apenas do que engole 10 minutos antes de treinar. Cientistas do desporto testam rotineiramente atletas em jejum ou com refeições leves para sessões curtas sem ver quebras dramáticas de energia, desde que a alimentação global se mantenha equilibrada.
Só algumas situações mudam o cenário: dietas muito baixas em calorias, janelas longas de jejum, certas condições médicas ou dias de treino intenso em sequência. No dia a dia, o corpo humano gere um esforço de 30 a 90 minutos com pouca dramatização.
Benefícios reais vs. embalagem “inteligente”
Isto não significa que os snacks desportivos não tenham utilidade. Significa que a sua utilidade é mais limitada do que a embalagem sugere. Em sessões curtas, a energia extra de barras e géis muitas vezes acaba como calorias a mais, em vez de melhor desempenho.
Para muitos atletas recreativos, os snacks desportivos ajudam sobretudo as vendas das marcas, não os tempos aos 5 km.
Treinadores veem o mesmo padrão nos clientes:
- peso a subir apesar de treino regular
- sensação de inchaço ou peso durante os treinos
- frustração quando “comer como um atleta” não leva ao progresso esperado
Nesse contexto, o problema não é uma barra ou uma bebida. É o reflexo: treino igual a snack, independentemente da duração, intensidade ou refeições anteriores.
Como comer quando as sessões ficam abaixo dos 90 minutos
Ignorar o corredor “desportivo” não significa treinar de estômago vazio. Um padrão simples de refeições, com algum cuidado no timing, costuma suportar muito bem treinos curtos a moderados.
Ajustar as refeições do dia à atividade
Nutricionistas que trabalham com atletas recreativos sugerem muitas vezes uma estrutura básica como esta:
- Treino de manhã: um pequeno-almoço completo 60–90 minutos antes (tosta integral, fruta, iogurte ou ovos, mais um punhado de frutos secos)
- Treino à hora de almoço: um pequeno-almoço leve e equilibrado e um almoço moderado um pouco mais cedo, ou um snack a meio da manhã se o almoço for tarde
- Treino ao fim do dia: um almoço normal e um pequeno snack à tarde 1–2 horas antes de ir ao ginásio
Durante o treino em si, água simples costuma ser suficiente para a hidratação até cerca de uma hora, em condições moderadas. As bebidas desportivas com sabor fazem mais sentido em sessões longas, muito suadas ou de alta intensidade, em que as perdas de hidratos de carbono e eletrólitos aumentam.
Para a maioria das sessões no ginásio depois do trabalho, água e um almoço sensato são uma combinação melhor do que uma bebida “de performance” açucarada.
Quando os snacks desportivos fazem mesmo sentido
Os produtos desportivos foram originalmente desenhados para situações em que o timing, a praticidade e a tolerância gastrointestinal realmente importam. O papel deles fica mais claro quando se olha para casos de uso, e não para as promessas do marketing.
| Situação | Os snacks desportivos são úteis? | Porquê |
|---|---|---|
| Sessão casual de 45 minutos no ginásio | Raramente | As reservas de glicogénio existentes cobrem o esforço |
| Corrida longa acima de 90 minutos | Muitas vezes, sim | A ingestão de hidratos atrasa a fadiga e o “ir abaixo” |
| Duas sessões intensas no mesmo dia | Às vezes | Hidratos de rápida digestão e proteína ajudam a reabastecer entre esforços |
| Atletas muito magros com grande volume de treino | Às vezes | Calorias fáceis ajudam a corresponder a necessidades energéticas elevadas |
| Corrida leve após um almoço normal | Não | O snack extra acrescenta calorias sem benefício real |
Esta lista mais restrita contrasta com a forma como as marcas posicionam os seus produtos: como companheiros do dia a dia para qualquer pessoa que calce ténis ou passe um cartão de ginásio.
Armadilhas comuns criadas por marketing esperto
Vários padrões empurram os consumidores para snacks desnecessários:
- Mensagens baseadas no medo: avisos sobre “quebras” de energia para quase qualquer esforço.
- Auréola de saúde: palavras como “proteína”, “fitness” ou “natural” dão a produtos ultraprocessados uma imagem virtuosa.
- Imitação: amadores copiam o que veem maratonistas de elite fazer, sem contexto sobre volume de treino e duração da prova.
Esse último ponto importa. Um triatleta profissional a treinar 25 horas por semana tem uma relação completamente diferente com a comida do que alguém que faz três aulas de 45 minutos. O equipamento pode parecer semelhante. As necessidades não.
Ouvir o corpo em vez da embalagem
Especialistas em nutrição desportiva defendem hoje uma mensagem pouco “na moda”: pare e sintonize antes de abrir mais uma embalagem. O corpo muitas vezes dá informação suficiente, se lhe dermos um momento para verificar.
Sinais de que talvez não precise dessa barra
Antes de pegar num gel ou num snack, alguns treinadores pedem aos clientes que respondam a duas perguntas rápidas:
- Quando foi a última vez que fiz uma refeição a sério com hidratos de carbono, proteína e alguma gordura?
- Quanto tempo e quão exigente vai ser esta sessão, na realidade?
Se a resposta for “comi um almoço normal há duas horas” e “vou fazer um treino de força de 40 minutos”, o corpo provavelmente tem combustível suficiente. A sensação de “devo comer porque vou treinar” reflete muitas vezes hábito ou ansiedade, mais do que açúcar no sangue realmente baixo.
A verdadeira hipoglicemia é intensa: tremores, suor frio, tonturas, fraqueza súbita. Um leve tédio ou vontade de doce é outra coisa.
Ter esta distinção presente ajuda a quebrar a ligação entre qualquer movimento e petiscar automaticamente.
Alternativas simples, de comida “a sério”, que funcionam
Para quem, de vez em quando, precisa de algo antes do treino, nutricionistas tendem a preferir alimentos básicos que o sistema digestivo já conhece bem. Exemplos:
- uma banana, que fornece hidratos de carbono de fácil utilização e potássio
- uma fatia de pão integral com uma camada fina de queijo fresco/cremoso ou manteiga de frutos secos
- um pequeno iogurte natural com uma colher de aveia ou frutos vermelhos
- um punhado de frutos secos desidratados, como passas ou tâmaras, para corredores que preferem algo muito compacto
Estas opções dão energia sem listas longas de ingredientes e adoçantes adicionados, comuns em muitos produtos “fitness”. Também ajudam a manter a alimentação global mais próxima de comida normal, e não de um regime permanente de suplementos.
Para lá dos 90 minutos: quando a estratégia muda mesmo
As coisas são diferentes quando os esforços passam regularmente de uma hora e meia. A partir daí, a disponibilidade de hidratos de carbono e o conforto gastrointestinal começam a limitar mais o desempenho. Em corridas longas, voltas de bicicleta ou caminhadas prolongadas, um plano de combustível, líquidos e eletrólitos pode realmente fazer ou desfazer a sessão.
É aqui que produtos especializados por vezes ganham o seu lugar: concentram hidratos de carbono rápidos num volume pequeno e procuram ser suaves para o estômago. Corredores a preparar meias-maratonas ou maratonas experimentam muitas vezes géis, bebidas e pastilhas mastigáveis para perceber o que resulta no dia da prova. Nesse contexto, uma abordagem mais técnica faz sentido.
Para quem vai ao ginásio no dia a dia, perceber esta diferença ajuda a cortar ruído. Sessões curtas pedem refeições regulares e água. As longas, sobretudo a maior intensidade, podem exigir uma ingestão calculada de hidratos e, por vezes, sódio. Misturar os dois mundos cria confusão e petiscar desnecessário.
Perspetivas extra para considerar
Um tema pouco falado é a formação de hábitos. Transformar cada treino numa ocasião para uma barra doce pode reforçar a ligação entre exercício e sobremesa. Ao longo de meses, esse padrão pode alterar o balanço calórico total o suficiente para travar objetivos de perda de peso ou definição muscular, mesmo que o rótulo pareça “saudável”.
Outro ponto diz respeito a atletas mais jovens. Adolescentes a treinar em clubes copiam muitas vezes o uso de snacks desportivos por adultos sem perceber dose, timing ou necessidade. Treinadores e pais que enquadram estes produtos como ferramentas raras, e não como rotina, podem ajudar a construir desde cedo uma relação mais sensata entre comida e desempenho.
Para quem ainda aprecia o ritual de comer algo depois do ginásio, um compromisso prático é tratá-lo como qualquer outro snack: contar com ele na ingestão do dia, ver o rótulo quanto a açúcar e ingredientes ultraprocessados, e perguntar se uma peça de fruta ou uma sandes caseira não faria o mesmo serviço. Essa pequena pausa já devolve o controlo da embalagem para a pessoa que treina.
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