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Parece cena de O Padrinho: esta aldeia siciliana no topo da colina parece saída de um filme.

Pessoa observa vila pitoresca com casas coloridas e igreja ao fundo sob céu azul claro.

Numa colina rochosa sobranceira ao mar Jónico, uma pacata aldeia siciliana continua a ensaiar a mesma cena: sol, pedra e silêncio.

Esta é Forza d’Agrò, uma comunidade medieval no topo de uma colina no leste da Sicília, onde mitologia cinematográfica, história antiga e vida quotidiana partilham ainda as mesmas ruas estreitas.

A aldeia onde o cinema e a vida real se confundem

Situada a cerca de 420 metros acima do nível do mar, numa crista íngreme, Forza d’Agrò parece quase irreal vista de baixo. As casas agarram-se à encosta. Os antigos muros desenham uma linha dentada contra o céu. Os terraços abrem-se de repente sobre o vale do Agrò, com vistas que se estendem do Etna até à faixa brilhante do mar Jónico.

O cenário não surgiu por acaso. O povoamento remonta à época bizantina, quando esta parte da Sicília era uma zona fronteiriça entre potências rivais. Fortificações ergueram-se ao longo das encostas para controlar o vale e o acesso à costa. “Forza” vem de “fortezza”, fortaleza, enquanto “d’Agrò” se refere ao vale abaixo.

Forza d’Agrò deve a sua aura cinematográfica às mesmas características que outrora lhe deram importância estratégica: altitude, isolamento e uma ampla vista sobre a paisagem.

Ao longo dos séculos, a aldeia passou por domínio normando, aragonês e espanhol. Cada um deixou marcas nas pedras, igrejas e praças. Hoje esse passado estratificado confere às ruas um ar ligeiramente teatral, como um palco que nunca esvazia totalmente após a cena final.

Cenário d’O Padrinho que nunca se reformou

Muitos visitantes chegam com uma memória muito específica em mente: o universo do “O Padrinho”, de Francis Ford Coppola. Algumas cenas da saga foram rodadas em Forza d’Agrò e arredores, que serviram de cenário para Corleone e outras localidades sicilianas fictícias. A escolha prendeu-se mais com a atmosfera do que com a geografia.

Ao passear pela rua principal ao entardecer, percebe-se por que os localizadores de cenários pararam aqui. Escadarias de pedra desaparecem entre casas. Pequenas praças inclinam-se para o vale. Residentes idosos trocam novidades em bancos feitos para longas conversas e olhares suspeitosos.

Não se reconhecem apenas sítios do filme; sente-se o ritmo dessas cenas na forma como a aldeia se move e pausa.

Várias praças, fachadas e ruelas apareceram no ecrã, e produções televisivas voltaram depois para séries à procura de ambiente semelhante. Ainda assim, Forza d’Agrò nunca se tornou um parque temático. A vida diária mantém o ritmo: sinos de igreja, o cheiro a molho de tomate vindo das cozinhas, as portadas lentas a abrir após o calor do meio-dia.

Ruas esculpidas em pedra e no tempo

O centro da aldeia forma um labirinto compacto. Ruas empedradas sobem em ziguezague, muitas vezes tão estreitas que duas pessoas têm de virar-se de lado para passar. Varandas transbordam de gerânios e vasos de manjericão. Portas antigas conservam ainda molduras de pedra esculpida da Baixa Idade Média.

  • Altitude: cerca de 420 m acima do nível do mar
  • Província: Messina, leste da Sicília
  • Pontos de vista: Vale do Agrò, Monte Etna, costa jónica
  • Célebre por: cenários de filmes, património medieval, festas religiosas

A sensação é meio museu, meio aldeia viva. As lojas são poucas: um bar na esquina, uma pequena mercearia, talvez uma oficina de artesão onde o tempo parece parado entre os anos 60 e ontem.

As igrejas que ancoram a aldeia

A chiesa Madre e os seus estilos sobrepostos

No centro ergue-se a Igreja da Santíssima Anunciada, conhecida localmente como Chiesa Madre, a Igreja Matriz. Construída por volta do século XV e alterada várias vezes, funde elementos medievais, renascentistas e barrocos, espelhando a própria história siciliana.

A fachada parece severa à primeira vista. A pedra local molda as paredes e o portal gótico-renascentista, conferindo ao edifício uma presença sóbria e quase defensiva. No interior, a planta segue a cruz latina, com nave central e capelas laterais. Frescos suavizam a pedra com cor e movimento.

A Igreja Matriz resume a aldeia: austera por fora, inesperadamente rica em pormenor lá dentro.

Para os habitantes, a igreja faz mais do que marcar o horizonte. Batizados, casamentos, funerais e grandes dias religiosos orbitam em torno deste edifício, que estrutura tanto o espaço físico como o calendário social de Forza d’Agrò.

A igreja da Trindade e o eco normando

Pouco longe ergue-se outro marco importante: a Igreja da Santíssima Trindade, datada do século XII. A arquitetura tem uma marca normanda mais forte, linhas firmes e volume compacto. Onde a Igreja Matriz mostra refinamento posterior, a Trindade mantém uma energia mais rude e antiga.

As duas igrejas formam um diálogo silencioso. Em conjunto, desenham o arco entre as necessidades militares dum posto fronteiriço e a vida religiosa e cívica de uma comunidade estabilizada. Para os visitantes, oferecem duas janelas distintas, mas ligadas, para a arquitetura siciliana.

Festas que acordam as ruas tranquilas

Durante grande parte do ano, Forza d’Agrò vive a baixo ritmo. A exceção são as festas religiosas, quando procissões, petiscos e música invadem as ruas. O exemplo mais marcante é a festa da Madonna della Catena, celebrada todos os anos e profundamente enraizada na devoção local.

O título “della Catena” refere-se a lendas em que a Virgem Maria liberta inocentes das correntes. Em Forza d’Agrò, essa história traduz-se num sentimento de proteção e segundas oportunidades que passa de geração em geração.

A 15 de agosto, a aldeia deixa de ser cenário de filme e torna-se palco de crenças, ruído e sabores próprios.

Música, cerimónias e fogo de artifício preenchem o dia e a noite. Bancas alinham-se pelas ruas, oferecendo iguarias típicas sicilianas: cannoli acabados de rechear, vinhos locais, tabuleiros de cassatelle e, claro, arancini, as bolas de arroz fritas que passaram de comida pobre a culto gastronómico.

Sabores moldados pelo mar e pela encosta

A mesa local reflete tanto a posição acima do vale como a proximidade do litoral. As trattorias familiares apostam em pratos simples onde os ingredientes são protagonistas em vez da técnica. As doses são generosas, os molhos ricos mas raramente pesados.

Maccheroni feitos à mão, às vezes enrolados em pauzinhos para ganhar forma, surgem no centro de muitas refeições. Chegam à mesa com ragù de carne guisada lentamente ou com molhos de peixe pescados nas vilas ali perto do Jónico.

As sobremesas apostam na ricotta, amêndoas e citrinos. Os cannoli variam de casa para casa; alguns usam massa mais grossa, outros acrescentam laranja cristalizada ou pepitas de chocolate. As cassatelle, pequenos pasteis muitas vezes recheados de ricotta e às vezes fritos, são uma alternativa mais delicada para quem acha as sobremesas sicilianas clássicas demasiado intensas.

Tão perto de Taormina, tão longe no ambiente

Geograficamente, Forza d’Agrò fica a poucos minutos de carro de Taormina, uma das estrelas da Sicília. Essa proximidade permite aos visitantes combinar, num só dia, duas experiências muito diferentes.

Taormina oferece o célebre teatro antigo, com espetáculos sobre o mar e, em noites limpas, a silhueta escura do Etna. O centro histórico atrai multidão constante, lojas de luxo e vida noturna. Em contraste, Forza d’Agrò mantém um ritmo lento, com noites resumidas à esplanada de um bar e meia dúzia de conversas sob candeeiros amarelos.

Forza d’AgròTaormina
Aldeia tranquila em colina com núcleo medievalEstância movimentada com público internacional
Célebre por cenários de filme e festas religiosasCélebre pelo teatro grego e praias próximas
Serviços limitados, forte ambiente localGrande oferta de hotéis, restaurantes e vida noturna

Muitos viajantes já combinam ambas: manhã nas vielas e terraços de Taormina, tarde a subir a encosta para ver a luz a desaparecer no vale do Agrò e jantar numa trattoria onde o empregado deve saber quem fez o pão e quem cultivou os tomates.

Conselhos práticos e pequenos riscos do sucesso

O crescimento do turismo cinematográfico começou a trazer mais visitantes a locais como Forza d’Agrò. Chegam fãs desejosos de “estar onde esteve o Michael” ou fotografar a rua que recorda um fotograma favorito. Esta forma de viagem tem vantagens e alguns riscos.

Pelo lado positivo, comunidades pequenas ganham rendimento, o que ajuda a manter edifícios e evita a saída dos jovens. Um fluxo modesto mas constante de visitantes sustenta bares, restaurantes e pequenas casas de aluguer que de outro modo poderiam desaparecer.

No entanto, existe o risco de uma narrativa só baseada no cinema apagar as histórias locais reais. Quando uma aldeia passa a ser apenas “a terra do Padrinho”, muitas camadas da sua identidade ocultam-se: tradições agrícolas, histórias de migração, costumes religiosos que marcam o ano muito mais do que um ocasional grupo turístico.

Para o viajante, a abordagem mais recompensadora é muitas vezes cruzar as duas dimensões. A referência ao filme funciona como porta. Lá dentro, a curiosidade leva à vida quotidiana: como se usa a praça principal num dia de inverno, onde brincam as crianças, que campos ainda são cultivados nas encostas.

Para quem planeia um roteiro maior no leste da Sicília, Forza d’Agrò combina bem com outros centros menos conhecidos do interior, onde palácios barrocos e antigos conventos rivalizam com olivais e laranjais. A aldeia torna-se então apenas uma paragem numa cadeia de lugares onde história e cinema por vezes cruzam caminhos, mas nunca substituem o som de vozes reais sobre a pedra.

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