A mulher no café não tirou as luvas até o café chegar.
Quando finalmente as retirou, o dorso das suas mãos contava uma história inteira: vermelho, gretado, com alguma tumefação à volta das articulações. Esfregou-as sem pensar, como se esfrega um músculo dorido depois de uma longa corrida.
Lá fora, as pessoas andavam apressadas, encolhidas nos casacos. Cá dentro, quase toda a gente fazia o mesmo ritual invisível: dobrar os dedos, puxar cutículas secas, verificar se aquela pequena fenda junto ao polegar tinha aberto de novo. O inverno não toca só na cara. Vai direto às mãos.
O barista deslizou uma chávena e sussurrou, meio a brincar: “As minhas mãos odeiam dezembro.” Ela mostrou-lhe a fissura fina e branca junto à unha. Parecia pequena, mas percebia-se que doía sempre que água quente ou sabão a tocavam. Ele fez uma careta, como se sentisse igual.
Há uma razão para o inverno parecer morder as mãos mais do que qualquer outra parte do corpo.
Porque é que as mãos gretam assim que chega o frio
O primeiro dia de frio costuma saber fresco, até revigorante. Depois a pele começa a protestar. Na cara, fica mais tensa. Nas pernas, começa a coçar. Nas mãos, a mudança pode ser brutal, quase de um dia para o outro, como se alguém trocasse em segredo a sua pele por lixa.
As mãos vivem no mundo real. Tocam em puxadores frios de metal, volantes, água da loiça, desinfetante em cada loja. Passam do ar quente ao vento gelado dez vezes ao dia. Esse choque constante – quente, frio, molhado, seco – remove óleos naturais mais rápido do que a pele os repõe.
Ao contrário do resto do corpo, raramente estão totalmente cobertas. O cachecol protege o pescoço. Uma camisola resguarda os braços. As mãos enfrentam tudo, expostas, a tentar viver enquanto a sua barreira protetora se vai tornando cada vez mais fina. Quando essa barreira enfraquece, as fissuras são quase inevitáveis.
Uma dermatologista em Londres contou-me que as queixas com as mãos no inverno aumentam todos os anos, quase como um relógio. As pessoas chegam com o mesmo relato: “As minhas mãos estavam bem em outubro. Em janeiro estavam abertas e a sangrar quando enfiava as mãos nos bolsos.” É um padrão consistente e, por isso, ainda mais frustrante.
Nas clínicas, vêm professores com dedos gretados de tanto lavar as mãos, enfermeiros com nós dos dedos abertos por causa das luvas de látex, pais com pele a descascar de limpar superfícies e caras todo o dia. Um pequeno estudo com profissionais de saúde no inverno revelou que mais de metade sofria de dermatite dolorosa nas mãos. Não é vaidade. É dor sempre que o sabão toca na pele.
Quase nunca falamos do lado emocional. O hábito de esconder as mãos nas fotografias. O estremecimento antes de lavar a loiça. O constrangimento ao apertar a mão a alguém, a pensar se a aspereza se nota. As mãos gretadas parecem pouco vistas de longe. De perto, mudam a forma como se vive o dia.
Há uma lógica clara para este desconforto sazonal. O ar frio tem menos humidade do que o quente, por isso à medida que a temperatura desce, a humidade baixa. Esse ar seco suga a água da camada externa da pele. Ao mesmo tempo, ligam-se os aquecimentos, tornando salas e escritórios em caixas de baixa humidade. A sua pele vive, basicamente, dentro de um desumidificador.
A camada exterior da pele, o estrato córneo, é feita de células encaixadas como tijolos, coladas por gorduras que funcionam como cimento. Quando essas gorduras desaparecem devido ao sabão, água quente e vento gelado, aparecem microfissuras. A água escapa. Irritantes entram. É quando surgem a vermelhidão, ardor e aquelas pequenas fendas junto às unhas.
As mãos sofrem mais porque esse “cimento” já é mais fraco ali. Menos glândulas sebáceas, uso constante, lavagens constantes. Quando a barreira se danifica, até produtos “suaves” podem queimar. Aqui, um ingrediente sem glamour mas aprovado por dermatologistas assume o papel de herói de inverno.
O ingrediente pouco glamoroso em que os dermatologistas confiam no inverno
Pergunte a dez dermatologistas como evitar fissuras no inverno e ouvirá sempre a mesma palavra: glicerina. Não é um ácido caro. Nem um extrato exótico. Só glicerina simples, pegajosa, da prateleira da farmácia. O ingrediente que a sua avó provavelmente tinha naquelas garrafas de vidro castanhas.
A glicerina é um humectante, ou seja, puxa literalmente a água para a camada superior da pele e ajuda a mantê-la lá. No frio, quando a hidratação natural escapa, esse “ímã da água” vale ouro. Não fica apenas à superfície. Atua dentro daquela estrutura de tijolo-e-cimento, repondo-a de modo a fechar microfissuras.
A maioria dos cremes clássicos para “mãos de trabalho” contém uma alta percentagem de glicerina por uma razão. É barata, estudada há décadas, e os dermatologistas conhecem-na bem. Não é elegante, mas resulta quando os seus nós dos dedos parecem de alguém vinte anos mais velho.
Numa terça-feira cinzenta de janeiro, vi um médico de família mostrar as próprias mãos a uma paciente. Estendeu-as: rosadas, um pouco descamadas, com linhas claras de antigas fissuras cicatrizadas. “Lavo as mãos entre cada doente,” disse ele. “Antes sangravam. Agora só se queixam.” O seu truque não foi um sérum de 60€. Era o creme da farmácia, embalagem banal e lista de ingredientes maioritariamente terminados em “-ina”.
Tinha um tubo na secretária, outro no bolso do casaco e um terceiro no carro. Sempre que saía de uma sala, aplicava uma quantidade do tamanho de uma ervilha. O ritual levava-lhe cinco segundos. Era tão automático como apertar o cinto do carro.
Muitos têm uma história semelhante. Enfermeiras que só usam um creme espesso nas noites de trabalho. Cabeleireiras que escondem uma loção rica em glicerina no armário das toalhas. Pais com frascos doseadores na muda das fraldas, usando-os também em si próprios. São pequenos hábitos sem glamour que mudam o inverno na pele.
A glicerina resulta porque não tenta ser esperta. Atrai água e, combinada com ingredientes que reforçam a barreira cutânea como petrolato, manteiga de karité ou ceramidas, mantém-na. Aplicada na pele ainda húmida – logo a seguir ao lavar –, transforma aquela camada passageira de água em algo que as suas mãos conseguem realmente reter.
Mas há uma ressalva. Usar um gel ligeiro só de glicerina num ambiente muito seco pode parecer que desaparece depressa demais. Aqui entra o método “sanduíche”: um pouco de água, um creme à base de glicerina, depois uma camada fina de algo mais oclusivo à noite. Essa sequência deixa a glicerina fazer o trabalho sem evaporar.
Como proteger as mãos no inverno sem perder a cabeça
A rotina invernal mais simples começa no lavatório. Troque sabonetes agressivos e perfumados por um gel lavante suave, sem fragrância. Lave com água morna (não quente). Seque as mãos dando pequenas pancadas, deixando-as ainda húmidas, e aplique de imediato um creme rico em glicerina. Sem distracções. Só lavar, secar, hidratar. Esse único gesto resolve metade do problema.
À noite, trate as mãos como o rosto. Uma camada mais espessa de creme – com glicerina e ceramidas ou petrolato –, depois luvas de algodão se suportar. Parecem ridículas. Funcionam. Em uma semana, muitas pessoas notam que a ardência matinal diminui e as gretas à volta das unhas amaciam.
Se uma fissura já está aberta e a doer, evite produtos agressivos. Fuja de fragrâncias. Um unguento simples sobre o creme de glicerina pode funcionar como penso enquanto a pele recupera.
Muitos subestimam a frequência com que é preciso hidratar as mãos no inverno. Uma vez por dia raramente chega quando se lava as mãos dez ou quinze vezes em 24 horas. Mas não é preciso uma rotina complicada. O importante é que o creme esteja onde está: junto ao lavatório, ao computador, no porta-copos do carro.
Sejamos honestos: ninguém faz isto à risca todos os dias. Esquecemos quando estamos cansados. Saltamos quando temos pressa. Depois chega a vaga de frio, e as mãos gritam. O objetivo é “mais do que antes”, não perfeição. Se hidratava uma vez ao dia, passe a três. Se nunca fazia, comece a aplicar antes de dormir e após lavar a loiça.
Os maiores erros que os dermatologistas veem não são dramáticos. São pequenos hábitos: água a escaldar, demasiado desinfetante sem hidratação a seguir, sabonetes perfumados que agradam mas secam, esfregar com toalhas ásperas. Cada um remove mais uma microcamada da barreira frágil.
“No inverno, não digo aos doentes para ‘mimarem’ as mãos”, diz a Dra. Rachel N., dermatologista. “Digo para tratarem as mãos como um ecrã partido. Proteger, cobrir, não mexer, e reparar devagar com as ferramentas certas.”
Quando a pele já dói, o que menos precisa é de culpa. O autojulgamento severo não cura fissuras mais depressa. Glicerina e uma toalha suave, sim.
Veja o cuidado de inverno das mãos como uma pequena rede de segurança – não mais um padrão de beleza inalcançável.
- Tenha sempre um creme rico em glicerina junto a cada lavatório que use.
- Troque para água morna e sabonete suave e sem perfume sempre que possível.
- À noite, faça o “sanduíche”: pele húmida → creme com glicerina → unguento mais espesso.
- Vista luvas de algodão durante 20–30 minutos depois da rotina noturna para um efeito intensivo.
- Se as gretas sangram ou não saram, procure ajuda: eczema e psoríase geralmente começam pelas mãos.
O que as suas mãos realmente lhe querem dizer neste inverno
Há sempre um momento de inverno em que repara mesmo nas mãos. A segurar no volante, ou a remexer nas chaves, e uma picada aguda atravessa a ponta de um dedo. É um nada, mas lembra-o do corpo. A mensagem é simples: esta pele não está a aguentar.
Fala-se muito em ouvir o corpo para dormir, comer, gerir o stress. As mãos ficam fora da conversa, apesar de serem das primeiras a mostrar que algo não está bem entre corpo e ambiente. Nós gretados são um mapa de torneiras quentes, sabões agressivos, manhãs apressadas e luvas por calçar.
A resposta não tem de ser grandiosa. Um sabonete mais barato, um tubo de creme de glicerina junto à pia, cinco minutos calmos à noite para massajar. Essas pequenas alterações somam-se. E espalham-se, mudando a forma de apertar mãos, segurar uma chávena, ou tocar quem se gosta quando a pele já não dói.
Num cais gelado ou num supermercado demasiado iluminado, olhe um instante para as mãos dos outros. Vermelhas, gretadas, esfoladas, escondidas. Não está só. Há algum consolo nisso. Quando partilha o truque que finalmente resultou – o creme de glicerina sem glamour, as luvas à noite – está a passar algo mais quente do que uma recomendação de produto.
Num dia mau, as mãos gretadas parecem mais uma responsabilidade falhada. Num dia bom, são só parte de ser humano neste mundo seco, aquecido e desinfetado. Entre esses dias, há um ritmo possível e pequeno que torna o inverno mais amável. Às vezes, a solução é tão simples como um frasco transparente e uma palavra longa acabada em “-ina”.
| Ponto-chave | Detalhe | Interesse para o leitor |
| Porque as mãos gretam no inverno | Ar frio e seco, aquecimento, lavagens frequentes e produção de sebo baixa enfraquecem a barreira da pele nas mãos. | Perceber que não é “só consigo”, mas sim uma reação lógica da pele ao ambiente. |
| Papel central da glicerina | A glicerina funciona como um íman de água, reidrata a camada córnea e atua melhor combinada com alguns agentes oclusivos. | Identificar o ingrediente-chave a procurar nos cremes e evitar compras inúteis. |
| Rotina simples mas constante | Lavar as mãos com água morna, sabonete suave, aplicar creme com glicerina após cada lavagem e um cuidado mais rico à noite. | Implementar gestos concretos e realistas para reduzir fissuras e dor diariamente. |
Perguntas Frequentes:
- Porque é que as minhas mãos gretam no inverno mas não no verão? O ar frio transporta menos humidade, o aquecimento seca ainda mais o ar e costuma lavar/desinfetar mais quando há doenças. Esta combinação desgasta a barreira da pele no inverno e as fissuras aparecem mais depressa.
- A glicerina é mesmo melhor do que cremes “inverno” mais caros? Muitos cremes “de inverno” eficazes baseiam-se na glicerina e depois são enriquecidos com outros ingredientes. Um creme simples, sem fragrância e rico em glicerina pode funcionar melhor do que produtos caros, se usado com frequência.
- Com que frequência devo usar creme de mãos no frio? O ideal é sempre que lavar as mãos e uma camada mais espessa antes de deitar. Se não for viável, tente pelo menos três vezes por dia: de manhã, a meio da tarde e à noite.
- As minhas mãos ardem quando ponho creme. O que posso fazer? Essa sensação pode ser sinal de uma barreira cutânea muito danificada ou de irritação causada por fragrâncias e outros aditivos. Mude para um creme ou pomada simples e sem perfume e consulte um dermatologista se a dor ou vermelhidão persistirem.
- Quando é que as mãos gretadas são sinal de algo mais sério? Se estão muito vermelhas, inchadas, pruriginosas, supurativas, ou se não saram após duas a três semanas de cuidados delicados, pode tratar-se de eczema, psoríase ou infeção. Aí é altura de procurar diagnóstico profissional.
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